ZOOTECNIA | 16/03/2015 às 00h00

Cavalos idosos recebem tratamento especial depois de aposentados

Em muitas propriedades do Brasil, os cavalos idosos são aposentados. Os animais, que já não têm mais força para o trabalho no campo, continuam vivendo com a tropa renovada, mas são poupados da lida.

“Serventia” é a palavra que historicamente representa o interesse do homem pelo cavalo. A utilidade, seja no esporte ou no trabalho, marca o início do contato do jóquei ou do peão com o animal.

O Brasil tem algo em torno de cinco milhões de cavalos e éguas e calcula-se que o número de animais idosos pode chegar a 50 mil. “Em geral, eles permanecem nas fazendas. Uma menor quantidade são destinados ao abate. O comprador de cavalo, que é aquele que vai diretamente na fazenda, ela paga em torno de R$ 50 a R$ 150 por animal. Isso é um dos fatores que não estimula muito o cuidado, a criação de cavalo especificamente para abate”, explica Rivaldo Nunes, veterinário e juiz de prova.

Em uma propriedade do município mineiro de Carmo do Cajuru, a tropa mistura animais novos com animais velhos. “Temos dois cavalos que estão aposentados por idade e já não conseguem trabalhar. Eles ficam aqui até o dia que Deus permitir”, diz André Luiz de Freitas Dias, tratador.

para va lida no campo, os escolhidos são sempre os que não passam muito dos 20 anos.

Com a experiência de quem trabalha há cerca de 30 anos com cavalos, o veterinário Rivaldo Nunes consegue reconhecer a idade dos animais através do desgaste dos dentes e outros sinais.
“O animal vai nos dando sinais que ele está mais velho, que ele está cansado do trabalho. Uma aparência mais abatida, mais cansada”, diz.

No município de São José (SC) fica a cavalaria da Polícia Militar. Essa é uma das unidades onde os cavalos são utilizados para ajudar na patrulha. Em todo o estado de Santa Catarina, há 180 cavalos envolvidos nesse trabalho.

“Ele tem que ser um animal calmo, corajoso, dócil. Um animal que tenha bons aprumos, que tenha uma boa andadura. Um animal que seja tranquilo na rua e que também não reaja frente às dificuldades que a gente vai enfrentar no dia a dia”, explica o Tenente Bessa, comandante de pelotão da PM montada de Santa Catarina.

“Depois de tanto tempo de longa jornada isso aí por madrugadas, por situações difíceis, a gente criou um laço. É um dos meus melhores amigos”, garante o soldado Lucas.

A veterinária Denise Leme, professora da Universidade Federal de Santa Catarina, desconfia dessa relação amistosa entre homem e cavalo, é que para ela o contato é impregnado de interesses. “É um pouco diferente daquela relação de afetividade que a gente tem com um cachorro, por exemplo. A pessoa quer um cachorro porque quer um companheiro. Ela pode trocar de cavalo ao longo do tempo, porque aquele cavalo já não supre mais as necessidades iniciais. Você tem que ser responsável por aquilo que você adquire. Não passar adiante um problema”, diz.

Isso faz parte da chamada posse responsável de animais e serve para criadores particulares e também para o governo. Em Santa Catarina, o destino dos cavalos velhos da polícia mudou. Com a intervenção do Instituto Ambiental Ecosul, uma ONG que entre outras coisas busca proteger os direitos dos animais, o estado deixou de incluir os animais nos seus leilões.

Isso foi em 2013, como conta o presidente do Ecosul, Halem Nery. “Tem que ser diferente, porque são seres vivos, não são coisas. Não são objetos. Então o encaminhamento deles tem que se outro. E nós então decidimos tentar, tentar convencer o governo do estado que não era o destino adequado não era o leilão, porque qualquer um podia ir lá comprar e colocar esses animais para puxar carroça. Levar eles para qualquer uma atividade inadequada”, comenta.

Os argumentos convenceram e todos os cavalos que já não servem para o trabalho na polícia seguem agora para doação. Para adotar um cavalo, o interessado se compromete com uma série de responsabilidades, detalhadas em um documento. O animal não pode ir a rodeio, não pode participar de corridas, muito menos puxar arados ou carroças. Se o acordo não for cumprido passam a valer as penas previstas nas leis de crimes ambientais e de proteção dos animais.

A operadora de caixa July Christie Nuernberg aceitou os termos de adoção e levou dois cavalos da polícia para o sítio da família, no município de Canelinha. “O meu marido viu a reportagem e falou para mim: vamos tentar?”, conta.

A tentativa resultou na adoção do Sênior, de 30 anos, e Épico, de seis, que não se adaptou ao trabalho da polícia por ser um cavalo que se assusta fácil. “Eu acho que eles estão muito mais felizes aqui, eu nem se fala!”, diz July Christie Nuernberg.

Seja por amor, seja por carinho, a posse responsável parece estar ganhando espaço entre os donos de cavalos. Em Sorocaba, no interior de São Paulo, um haras abriu suas porteiras para receber animais aposentados, vindos principalmente das hípicas. Ricardo Facchini, dono do haras, ressalta que as características do terreno da propriedade são boas para os animais que estão mais fragilizados.

“Para manter o animal no piquete, o dono paga entre R$ 500 e R$ 600. Se for dormir em cocheira é mais caro, se tem ração especial, medicamento, cobramos sobre aquilo que gastamos”, diz.

Não basta o cavalo parar de trabalhar, ele precisa ser preparado para esta nova fase da vida. Muitos animais passaram muitos anos presos, então a adaptação deve ser progressiva, para depois alterar o ritmo e estilo de vida dele.

É consenso entre os proprietários de cavalos que para se aposentar o animal deve ficar sem a ferradura. O metal que o acompanhou desde que foi feita a doma, por volta de três anos de idade, sai de cena e o símbolo maior nessa fase da vida passa a ser contato direto da pata com o chão.


Fonte: Revista Globo Rural

  

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